Quando o cooperativismo deixa de ser conceito e vira escolha de vida

Foram mais de 20 anos no sistema financeiro tradicional até que a transição de carreira abriu um novo horizonte. No mestrado, conheci o cooperativismo — e tudo fez sentido. Descobri um modelo que valoriza pessoas, pertencimento e prosperidade compartilhada. Minha trajetória, antes movida por performance, encontrou propósito na educação, no coletivo e no impacto real. O cooperativismo deixou de ser trabalho: virou modo de vida.

Fernanda Chidem

11/27/20252 min read

Durante muitos anos, vivi o universo das instituições financeiras tradicionais. Foram mais de duas décadas de aprendizado, convivendo com gente que vinha de todo lado, desenvolvendo equipes e conhecendo profundamente o sistema financeiro sob a ótica da eficiência, do resultado e da performance. Por muito tempo, esse era o mundo que fazia sentido para mim — até que, aos poucos, percebi que, por mais que eu gostasse do meu trabalho, queria mais, outros universos, outros públicos.

Depois de 23 anos nessa trajetória, decidi mudar o rumo. Fiz o movimento mais desafiador e libertador da minha vida, a famosa transição de carreira: pedi demissão e fui fazer um mestrado. Na época, eu não sabia exatamente o que procurava, mas sabia o que não queria mais — não queria trabalhar apenas pelo dinheiro que entrava na conta todo mês. Queria trabalhar com gente. E foi no meio acadêmico que conheci pessoas ligadas ao cooperativismo. A partir dali minha forma de enxergar o trabalho nunca mais foi a mesma.

As formações que fiz ao longo da vida tiveram um papel essencial nessa caminhada. Foram várias — pós-graduações, MBAs, certificações (o famigerado CFP), e o próprio mestrado, cheio de desafios— todas movidas por uma curiosidade constante e pela vontade de compreender mais profundamente o que eu poderia fazer de diferente. Muita gente me perguntava por que estudar tanto, e a resposta, embora eu nem sempre tivesse clareza na época, era simples: porque aprender sempre me manteve em movimento. Olhando hoje, percebo que cada curso, cada novo tema, me preparava silenciosamente para o cooperativismo — um espaço que valoriza justamente essa busca por conhecimento e desenvolvimento contínuo.

O primeiro contato com o modelo cooperativo me despertou uma curiosidade que logo virou encantamento. Aquela lógica de prosperidade compartilhada, de sucesso coletivo e de protagonismo das pessoas me atravessou profundamente. Descobri um sistema financeiro que não gira em torno do lucro, mas do pertencimento. Um lugar onde as decisões têm rosto e aonde o resultado volta para quem o constrói.

Como colaboradora, vivi na pele o que costumo ver acontecer com tantos outros profissionais quando conhecem o cooperativismo de perto: o entendimento desperta o engajamento. Quando a gente entende o porquê, tudo muda — a relação com o trabalho, com os colegas, com os associados, com a própria comunidade e até dentro de casa. Eu mesma me vi transformada e, naturalmente, comecei a querer que outras pessoas vivessem isso também.

Como diz Paul Singer, um dos grandes pensadores da economia solidária, “a cooperação é a forma mais humana de competir”. Essa frase traduz exatamente o que vivi ao longo dessa transição: a descoberta de que é possível ser eficiente sem perder o sentido, crescer sem deixar ninguém para trás, e competir com o mercado sem abrir mão da solidariedade.

Com o tempo, o cooperativismo deixou de ser apenas o ambiente onde eu trabalhava e passou a ser o lugar de onde eu falo e para onde escolho ir. Foi essa compreensão que me levou à Coletiva — um espaço onde pude reunir minhas experiências anteriores, meu amor pela educação e a crença de que o conhecimento transforma realidades.

Hoje, olho para minha trajetória e percebo que o cooperativismo não entrou na minha vida por acaso. Ele chegou como um reencontro com aquilo que sempre me moveu: o desejo de ver as pessoas crescendo juntas. Porque quando a gente entende o cooperativismo de verdade, ele deixa de ser um modelo de negócio e se torna um modo de vida.