Certa vez, em conversa com uma amiga muito querida que buscava novos caminhos para a sua empresa, ofereci uns contatos de pessoas próximas que poderiam contratar seus serviços. A ideia dela era ganhar escala com o que ela já fazia muito bem, inclusive com reconhecimento do mercado. Grandes empresas estavam na lista dos seus clientes e eu pensei: vou ajudá-la com quem conheço, isso a fará avançar. Compartilhei com ela nomes e telefones, avisei os meus amigos indicados sobre a intenção desta ponte e, para mim, missão cumprida.
Passei um tempo sem vê-la. Quando nos encontramos, ela que conhece bem meu histórico profissional, solta a frase: “Amiga, preciso te agradecer! Falei com algumas pessoas e encaminhei bons negócios a partir dos seus contatos. Tenho pensado em como tu praticas a cooperação, não é só teoria esse teu negócio, é a tua vida.” Eu já havia ficado feliz com a possibilidade de contribuir lá atrás e percebi o quanto a cooperação pode passar despercebida por todos nós.
O cooperativismo é isso! Não é só a teoria dos livros, é viver com cooperação no dia a dia, é entender que aqueles 7 princípios precisam fazer parte da sua vida, seja qual for a sua atividade profissional, porque não é só trabalho, é vida. É procurar o queijo que vem da cooperativa na geladeira do supermercado, é olhar o selo do que se compra para ter certeza de que é produzido “aqui” e que se contribui com a economia local, e é ajudar uma amiga que quer expandir a empresa. Falei dos Princípios aqui, mas qualquer analogia que façamos, leva à prática dos valores do cooperativismo. Ao agirmos com Solidariedade, Igualdade, Liberdade, Justiça Social, Equidade, Honestidade e outros, estamos sendo coerentes a esta doutrina que se torna gigante, muito maior do que nossas práticas diárias.
Quando se fala de cooperativismo, logo lembramos da história do incansável Padre Amstad com a sua mula Diana desbravando o Rio Grande do Sul e levando coragem ao povo para empreenderem na formação das cooperativas. O padre, lá atrás, vendeu uma ideia aos seus fiéis, de que todos, juntos, podiam muito mais. Já se vão aí mais de 120 anos que a ideia segue dando frutos...
Nossa essência é isto, viver o cooperativismo como filosofia de vida, pensando e agindo com valores e princípios traduzidos na prática do dia a dia, trabalhando para que a vida seja sustentável, perene e cooperativa.
A essência do cooperativismo é fazer o bem, a exemplo do que vemos nas comunidades onde as cooperativas são atuantes, onde ações são desenvolvidas com recursos que foram investidos nas cooperativas pelos seus sócios, onde um associado recebe um crédito para ampliar seu negócio porque outro acreditou e depositou seus recursos lá, onde a intercooperação acontece entre a cooperativa de trabalho e a de crédito. Seja qual for o seu ramo, está no DNA do cooperativista a comunhão, a partilha e o olhar ao próximo, que por consequência, se estende aos locais onde as cooperativas estão inseridas. Quando percebemos um acontecimento local, envolvendo a comunidade, seja alguma ação esportiva ou um evento social, lá estará o nome de algumas cooperativas como parceiras da realização do encontro. Este olhar para “os seus” é um diferencial que muitas vezes pode ser até balizador no mercado.
Já vimos um grande banco baixar as taxas de juros para poder concorrer com a cooperativa de crédito que está logo ali do outro lado da rua. O produtor pode receber um valor melhor pelo quilo da soja que colheu ao entregar o seu produto na cooperativa, em vez de vendê-lo no mercado. A cooperativa de educação vende educação corporativa para uma cooperativa financeira ao invés de vender para uma S/A. São simples exemplos de como as cooperativas impactam as comunidades onde estão inseridas.
Cooperativas são diferentes de Bancos. São sociedades onde a relação com o associado é pessoal, há muito mais que preocupação em ser justo com os preços praticados, há um olhar sobre o associado como pessoa, como alguém que é membro de uma comunidade e que é dono do negócio, é para ele que as cooperativas trabalham, para que as sobras deste resultado justo, sejam compartilhadas ao final do exercício. A inclusão financeira também é um diferencial das cooperativas em relação aos bancos, o processo de bancarização é feito à medida que o acesso é permitido a todos, onde o crédito é concedido pensando na sustentabilidade do associado, e não em entregar dividendos ao acionista.
Lá no passado, quando os probos de Rochdale atravessaram as montanhas congeladas carregando o carrinho para buscar as compras que dariam início ao negócio gerador de renda a todos, talvez não imaginasse o quanto aquela ideia seria o adubo de uma terra fértil para quem quisesse cooperar para prosperar. Eles só tinham uma ideia e uma certeza: aquele movimento atenderia de forma justa as necessidades da comunidade.
Segue sendo assim. No cooperativismo de qualquer ramo, se tudo correr bem, o sócio, ao final do exercício, recebe as sobras pela sua coparticipação na geração deste resultado. Aí está talvez a maior entrega do cooperativismo, que assim é desde Rochdale, o retorno acontece de forma justa e equânime, fazendo com que todos se beneficiem daquilo que todos se esforçaram para entregar.
O cooperativismo surge da necessidade de atender de forma adequada a comunidade. Estando presente e oferecendo as soluções adequadas ao seu associado. Que bom que este movimento cresceu, que existem muitos ramos de atuação, que conhecendo e acreditando, fazemos parte deste universo de prosperidade e boas colheitas.
Atuando no cooperativismo somos vendedores de ideias, com as tecnologias a nosso favor, podemos usufruir dos mecanismos de acesso à informação para conhecermos melhor nosso associado, identificando o que realmente é adequado ao seu perfil e realidade financeira, se estivermos falando das cooperativas de crédito, por exemplo.
“É sabido que as cooperativas surgiram e continuam surgindo em tempos de crise. As cooperativas permitem obter a realização econômica para seus associados, distribuem renda, geram benefícios sociais e no plano político, permitem ao associado espaços de participação e a assunção do protagonismo no processo decisório da atividade econômica e organizacional.” José Odelso Schneider
Na fala do Padre Odelso enxergamos os referenciais do cooperativismo muito claros, e são estes referenciais que nos inspiram. Na educação corporativa cooperativista, vendemos educação, mas não é um amontoado de PPT’s que servem para todos de forma genérica. O processo de educação, a exemplo do cooperativismo, sendo construído a muitas mãos, deve ser focado sempre na realidade de quem demanda o processo educativo. Programas de educação não podem ser de prateleira quando a necessidade for para demandas específicas, para realidades diferentes. Quanto mais customizada, melhor é a entrega, maior é o impacto, mais evidente o resultado. Que resultado é este? Eficiência de processos, associados bem atendidos, necessidades sanadas, mais negócios e mais resultados. Que impactam onde? Na comunidade local, devolvendo ao associado a credibilidade depositada na instituição. Pronto! No cooperativismo todos ganham!
Por Fernanda Chidem, diretora e educadora da Cooperativa Coletiva